Me visitam
maio 31, 2011
"(...) A vida autossuficiente, a paixão e a separação também são sinônimos, significam ruptura, descarrilhamento e novas opções no trem do destino. É a hora em que a sorte muda, quando a vida real atropela e interrompe o jogo. Não estão sozinhas. No mesmo trem viajamos todos, casados, solteiros, viúvos e separados. "O inesperado é teimoso", porque os trilhos são férreos, duros e com poucas alternativas, por isso a teimosa tendência a repetir trajetos. Os bons maquinistas, quando estão insatisfeitos, param o o trem e não têm outra opção a não ser avançar ou voltar, até encontrar o lugar exato onde mudar de trilho. Essa é a sorte, o jogo, o destino e, às vezes, por que não?, o inconsciente".
maio 30, 2011
maio 29, 2011
“O que eu sou aos olhos da maioria das pessoas? Uma pessoa sem importância, um excêntrico ou alguém desprezível, alguém que não tem nenhuma posição na sociedade e nunca terá. Pois bem, mesmo se eles estivessem absolutamente certos, então eu gostaria de um dia mostrar, pelo meu trabalho, o que um excêntrico, o que um ninguém traz em seu coração”
Sabe ser triste não é legal, nem tem sido muito cool, ser triste as vezes é patologia e das graves, por mais que saibamos que há um impulso criativo que vem dessas tristezas, elas nunca vem sozinhas, e nunca se vão sem que deixem alguma marca bem profunda na sua vida, na sua alma e muitas vezes deixam marcas no seu corpo.
Sei bem que fingir uma alegria que não existe não é motivo de orgulho, sei que nada é exatamente com a gente gostaria, e que é preciso se transportar pra dentro as vezes pra se desvendar, se descobrir e a tristeza é que te leva pra esse lugar, mas cuidado porque tristeza demais leva embora as coisas e as pessoas que amamos, leva embora o bom humor, leva embora a ironia nossa de cada dia. Tristeza demais perde o charme do drama, perde a noção da realidade que brinda com beleza qualquer coisa quando se tem olhos sãos pra se enxergar, tristeza fere feio e não devolve o tempo perdido, tristeza te leva embora, te faz odiar a si mesmo, cuidado pra não eliminar a coisa errada.
“-Deus louvado, eu não sei quais são os “direitos” que um homem tem! E, se há solução para o tédio, não a conheço. Se conhecesse, seria o primeiro filósofo que teria inventado um remédio para a vida. Mas uma coisa eu sei: para cada pessoa que confessa ser a sua existência enfadonha, e desnecessariamente enfadonha, há umas dez que pensam do mesmo modo, sem no entanto reconhecê-lo. E creio sinceramente que, se nós desabafássemos e o confessássemos de vez em quando, em lugar de sermos pacientes, bons e leais durante sessenta anos, e depois pacientes, bons e defuntos para o resto da eternidade.. bem, podia ser que achássemos a vida mais divertida.”
maio 28, 2011
Josef : Eu achei um, você e eu, talvez possamos ir para algum lugar. Juntos. Um dia destes. Hoje. Agora mesmo. Venha comigo.
Hanna : Não, eu não acho que vai ser possível.
Josef : Por que não?
Hanna : Hum, porque eu acho que se nós formos embora para algum lugar juntos, eu tenho medo que, ah, um dia, talvez não hoje, talvez sim, talvez não seja amanhã, mas um dia, de repente, eu posso começar a chorar e chorar tão alto que nada nem ninguém poderá me parar e as lágrimas vão encher a sala e eu não vou ser capaz de respirar e eu vou te puxar para baixo comigo e nós dois vamos afogar.
Josef : Eu vou aprender a nadar, Hanna. Eu juro, eu vou aprender a nadar.
Acho incrível como algumas coisa acontecem de repente e você comece a puxar os fiozinhos e descobre que tem coisinhas ligadas uma a uma. Acabei de ler o livro do Philip Roth Animal Agonizante, não vi o filme baseado nele mas estive vendo alguma coisa e vejam só, descobri que foi a Isabel Coixet quem o dirigiu, o livro me foi indicado como leitura de pesquisa exemplificativa para meu tcc, e no começo achei que não se enquadraria exatamente naquilo que estava pesquisando, agora já consigo dar um significado a ele, mas voltando a Isabel foi ela que dirigiu dois filme de gosto muito, Minha Vida Sem Mim e A vida Secretas da Palavras, filme este que inspirou o nome do meu blog.
maio 27, 2011
A carne cobre os ossos e colocam uma mente ali dentro e algumas vezes uma alma, e as mulheres quebram vasos contra as paredes e os homens bebem demais e ninguém encontra o par ideal mas seguem na procura rastejando para dentro e para fora dos leitos.
A carne cobre os ossos e a carne busca muito mais do que mera carne.
De fato, não há qualquer chance: estamos todos presos a um destino singular.
Ninguém nunca encontra o par ideal.
As lixeiras da cidade se completam,
os ferros-velhos se completam
os hospícios se completam
as sepulturas se completam
nada mais se completa.
maio 26, 2011
“A verdade é que, enquanto você estiver assim, nessa interminável agonia, esperando notícias que nunca chegam, vai deixar passar várias possibilidades interessantes ao seu redor. Claro, ninguém se compara a quem você aguarda, mas quem você aguarda não está disponível no momento. Poderá, inclusive, nunca estar, apesar de tudo o que foi dito naquele dia. Pessoas que somem não são confiáveis.”
“Confesso que ando muito cansado, sabe? Mas um cansaço diferente… um cansaço de não querer mais reclamar, de não querer pedir, de não fazer nada, de deixar as coisas acontecerem. Confesso que às vezes me dão umas crises de choro que parecem não parar, um medo e ao mesmo tempo uma certeza de tudo que quero ser, que quero fazer. Confesso que você estava em todos esses meus planos, mas eu sinto que as coisas vão escorrendo entre meus dedos, se derramando, não me pertecendo.Estou realmente cansado.Cansado e cansado de ser mar agitado, de ser tempestade… quero ser mar calmo. Preciso de segurança, de amor, de compreensão, de atenção, de alguém que sente comigo e fale: “Calma, eu estou com você e vou te proteger! Nós vamos ser fortes juntos, juntos, juntos.” Confesso que preciso de sorrisos, abraços, chocolates, bons filmes, paciência e coisas desse tipo. Confesso, confesso, confesso. Confesso que agora só espero você
maio 25, 2011
Porque não
Há um motivo para dizer
que eu seria mais feliz sozinha.
Não foi porque eu pensei
que seria mais feliz sozinha.
Foi porque eu pensei
que se eu amasse alguém
e depois acabasse
talvez eu não conseguisse sobreviver.
É mais fácil ficar sozinho.
Por que, e se você descobrir
que precisa de amor?
E depois você não o tem.
E se você gostar?
E depender dele?
E se você modelar a sua vida em torno dele?
E então... Ele acaba.
Você consegue sobreviver a esta dor?
Perder um amor é como perder um órgão. É como morrer.
A única diferença é a morte termina.
Isso pode continuar para sempre.
"Porque eu tô ainda muito inseguro de mim mesmo, e não acreditando absolutamente que alguém possa me curtir bem assim como eu sou. Eu não tenho quase experiência dessas transações, me enrolo todo, faço tudo errado — acabo me sentindo confuso. Tudo isso é tão íntimo, e eu já estou tão desacostumado de me contar inteiramente a alguém, tão desacreditando na capacidade de compreensão do outro, sei lá, não é nada disso, sabe? Conviver é difícil — as pessoas são dificeis — viver é dificil paca."
Porque realmente tá tudo muito complicado, é mais facil viver assim longe de todas essa interação que não muda nada, ondes as falas sempre são as mesmas ainda que os interpretes mudem constantemente.
"Estou me transformando aos poucos num ser humano meio viciado em solidão. E que só sabe escrever. Não sei mais falar, abraçar, dar beijos, dizer coisas aparentemente simples como "eu gosto de você". Gosto de mim. Acho que é o destino dos escritores. E tenho pensado que, mais do que qualquer outra coisa, sou um escritor. Uma pessoa que escreve sobre a vida – como quem olha de uma janela – mas não consegue vivê-la."
Tão vazia quanto antes, a gente busca no outro sempre o que não sabe definir na gente, tão vazia e perdida, por mais instintiva que seja a vida ha algo que não e preenchido apenas pelo que os cinco sentidos podem alcançar, animais sempre mas com alguma coisa incompleta, alguma procura, alguma lacuna, viver só não basta.
maio 23, 2011
'Estou feliz, saudável, animado e sexy que é um desperdício...'
É como se o tempo não fosse mais parar para que as coisas voltassem a ser contadas de forma lenta de dolorosa, era como se sentisse que as coisas eram mais bem vividas da forma mais viva quando admitisse que era um animal cheio de desejos e necessidades que antes não me eram permitidos sequer pensar. Tudo estava muito aberto a mim mas no fundo tinha a plena certeza, que esse tempo era breve e mentia o tempo todo.
maio 22, 2011
A vida é toda um processo de demolição. Existem golpes que vêm de dentro,
que só se sentem quando é demasiado tarde para fazer seja o que for,
e é quando nos apercebemos definitivamente de que em certa medida
nunca mais seremos os mesmos.
Eu desisti, não da forma que as pessoas pensam que é desistir mas desisti de achar um culpado, uma cura, um motivo, as pessoas ao meu redor estão caindo, despencando, eu não consigo os ajudar, é como se eu estivesse a kil0metros de distancia, em um lugar que observar e a única forma de viver.Não tenho me perguntado por que, nem mesmo tento pedir ajuda, estou apenas seguindo, me tortura saber que muitos já não suportam, que muitos seguem em frente, que outros nem sequer percebem o que está acontecendo, expectadora de tudo isso sigo congelada, como se não me atingindo as coisas me ferissem ainda mais.
Preciso pedir paciência, preciso acreditar que isso passa, eu acredito mas aqueles que amo? Como salva-los nesse barco furado que me precipitei em mar aberto, como salva-los se nem sei se ainda eu estou a salvo, o que dizer se fui quem puxou o gatilho. É hora de cuidar da dor do outro, mas com que experiência senão está que carrego, é hora da dar mão mas como não levar o outro para o abismo que procuro, quando não tenho o que dizer, quando não consigo mais sentir, como posso carregar alguém pra frente se não enxergo o futuro?
A única coisa que tenho a oferecer a meus amigos é meu amor, e minha compreensão de suas escolhas, a única coisa que posso saber é que é preciso aceitar o absurdo da vida porque se há algum sentido nisso tudo nos foi escondido, preciso faze-las enteder que nem mesmo eu sei como lidar com isso mas que sozinha não quero ficar.
maio 20, 2011
Eu fui assaltada, não se preocupe está tudo bem agora mas veja só, não fui assaltada de repente, sem chances de reação ou porque caminhava por em lugar perigoso, fui assaltada porque sempre penso que não está realmente acontecendo algo comigo, eu estava lá, essa coisa não precisava ter acontecido, demorou muito até que fosse abordada, demorou muito até que chegasse até mim, não fosse minha eterna distração do mundo, não fosse minha falta total de interesse no que acontece ao meu redor, não fosse meu "nunca é comigo".
As consequências disso provavelmente serão anos de terapia, será esse medo do que na verdade não existe mais, será esse torpor causado por pílulas que não te deixam pensar, mas há o que realmente me aconteceu por trás de toda esse realidade social que me atingiu, por trás de tudo isso há o que me torno, alguém com total falta de noção de que esta vivendo, porque se tivesse ao menos naquele momento atenta a minha própria vida, saberia ou preveria o que me aconteceu, esqueço que minha bolha só existe pra mim mesma, a minha bolha não me protege de ser vista, só de ver, a minha bolha estoura se tocada do lado de fora, na verdade sou eu que estou presa.
Enquanto o tempo estiver passando de pressa, me levando todo dia para um outro dia seguirei, e quando me darei conta de que a as coisas não estão acontecendo dentro de mim? E quando perceber que vivi uma vida de vazios preenchidos com a pressa de chegar sempre no próximo capitulo da história? Será muito tarde?
Quando fui tocada com violência algo se rompeu em mim, algo que não consigo definir ainda, algum tipo de proteção que acreditava possuir mas que não me protegeu da realidade, é como se o mundo por mim criado tivesse ruído um pouco e esse limbo que existe entre o estar sonhando e o estar acordado fosse agora meu novo endereço.
já me matei faz muito tempo me matei quando o tempo era escasso e o que havia entre o tempo e o espaço era o de sempre nunca mesmo o sempre passo morrer faz bem à vista e ao baço melhora o ritmo do pulso e clareia a alma morrer de vez em quando é a única coisa que me acalma
maio 19, 2011
maio 18, 2011
— Você crê no Deus? Ele rira: — Você ainda está nessas perguntas de adolescente? A pergunta é infantil. A resposta é a seguinte: eu sinto que não me mexo na vida dentro de um vazio absoluto exatamente porque também sou Deus. Um dia, quando eu tiver mais vontade e se você ainda quiser, eu lhe falarei de como me mexo dentro de Deus. Rememorando, ela estranhou Ulisses como um ser à parte, como se já não o conhecesse tão bem. Lembrou-se de que ele acrescentara para finalizar o assunto sobre Deus: — De qualquer modo, dissera com um jeito impessoal, como se não falasse de si próprio, sou dos que crêem no que é inacreditável. Aprendi a viver com o que não se entende.
A tua atitude te eleva para o alto.
Vejo que cortaste definitivamente todas as amarras.
Daqui eu adivinho os olhos dos homens perdidos no tempo que nada descobrirão de ti.
Deixa que os não-poetas falem de tua beleza, esses nunca compreenderão o que há em ti de sombra de sementes germinando, de vozes de cavernas.
Nem ao menos que é o teu olhar que nos aproxima que nos torna irmãos para o resto do tempo.
Eu te reconheceria entre todas, porque tua presença eu a pressinto. Deixa que tuas formas eles a tomem pela essência.
Esses te perderão ainda mais e nunca compreenderão tuas inúmeras sugestões que tu mesma desconheces.
maio 17, 2011
Fim de tarde. Dia banal, terça, quarta-feira. Eu estava me sentindo muito triste. Você pode dizer que isso tem sido frequente demais, ou até um pouco (ou muito) chato. Mas, que se há de fazer, se eu estava mesmo muito triste? Tristeza-garoa, fininha, cortante, persistente, com alguns relâmpagos de catástrofe futura. Projeções: e amanhã, e depois? e trabalho, amor, moradia? o que vai acontecer? Típico pensamento-nada-a-ver: sossega, o que vai acontecer acontecerá. Relaxa, e flui: barquinho na correnteza, Deus dará. Essas coisas meio piegas, meio burras, eu vinha pensando naquele dia. Resolvi andar.Andar e olhar. Sem pensar, só olhar: caras, fachadas, vitrinas, automóveis, nuvens, anjos bandidos, fadas piradas, descargas de monóxido de carbono.
Da praça Roosevelt, fui subindo pela Augusta, enquanto lembrava uns versos de Cecília Meireles, dos Cânticos "Não digas: 'Eu sofro'. Que é que dentro de ti és tu? Que foi que te ensinaram/que era Mas não conseguia parar. Surdo a qualquer zen-budismo, o coração doía sintonizado com o espinho. Melodrama: nem amor, nem trabalho, nem família, quem sabe nem moradia - coração achando feio o não-ter. Abandono de fera ferida, bolero radical. Última das criaturas, surto de lucidez impiedosa da Big Loira de Dorothy Parker. Disfarçado, comecei a chorar. Troquei os óculos de lentes claras pelos negros - filme. Resplandecente de infelicidade, eu subia a Rua Augusta no fim de tarde do dia tão idiota que parecia não acabar nunca. Ah! como eu precisava tanto de alguém que me salvasse do pecado de querer abrir o gás. Foi então que a vi. Estava encostada na porta de um bar. Um bar brega - aqueles da Augusta-cidade, não Augusta-Jardins. Uma prostituta, isso era o mais visível nela. Cabelo malpintado, cara muito maquiada, minissaia, decote fundo. Explícita, nada sutil, puro lugar comum patético. Em pé, de costas para o bar, encostada na porta, ela olhava a rua. Na mão direita tinha um cigarro, na esquerda um copo de cerveja. E chorava, ela chorava. Sem escândalo, sem gemidos nem soluços, a prostituta na frente do bar chorava devagar, de verdade. A tinta da cara escorria com as lágrimas. Meio palhaça, chorava olhando a rua. Vez em quando, dava uma tragada no cigarro, um gole na cerveja. E continuava a chorar - exposta, imoral, escandalosa - sem se importar que a vissem sofrendo.Eu vi. Ela não me viu. Não via ninguém, acho. Tão voltada para a própria dor que estava, também, meio cega. Via pra dentro: charco, arame farpado, grades. Ninguém parou. Eu, também, não. Não era um espetáculo, não era uma dor reluzente de néon, não estava enquadrada ou decupada. Era uma dor sujinha como lençol usado por um mês, sem lavar, pobrinha como buraco na sola do sapato. Furo na meia, dente cariado. Dor sem de gente habitando aquela camada casca-grossa da vida. Sem o recurso dessas benditas levezas de cada dia - uma dúzia de rosas, uma música de Caetano, uma caixa de figos.Comecei a emergir. Comparada à dor dela, que ridícula a minha, dor de brasileiro-médio-privilegiado.
Fui caminhando, mais leve. Mas só quando cheguei à Paulista compreendi um pouco mais. Aquela prostituta chorando, além de eu mesmo, era também o Brasil. Brasil 87: explorado, humilhado, pobre, escroto, vulgar, maltratado, abandonado, sem um tostão, cheio de dívidas, solidão, doença e medo. Cerveja e cigarro na porta do boteco vagabundo: carnaval, futebol. E lágrimas. Quem consola aquela prostituta? Quem me consola? Quem consola você, que me lê agora e talvez sinta coisas semelhantes? Quem consola este país tristíssimo?
Vim pra casa humilde. Depois, um amigo me chamou para ajudá-lo a cuidar da dor dele. Guardei a minha no bolso. E fui. Não por nobreza: cuidar dele faria com que eu me esquecesse de mim. E fez. Quando gemeu "dói tanto", contei da moça vadia chorando, bebendo e fumando (como num bolero). E quando ele perguntou "por quê?", compreendi ainda mais. Falei: "Porque é daí que nascem as canções". E senti um amor imenso. Por tudo, sem pedir nada de volta. Não-ter pode ser bonito, descobri. Mas pergunto inseguro, assustado: a que será que se destina?
No decorrer dos séculos, a História dos povos não passa de uma lição de mútua tolerância, e assim, o sonho último será envolvê-los todos numa ternura comum para os salvar o mais possível da dor comum. No nosso tempo detestar-se e ferir-se porque não se tem o crânio construído exactamente da mesma maneira, começa a tornar-se a mais monstruosa das loucuras.
maio 16, 2011
Eu me arrebentei, assim, porque o nó era fraco, frouxo,mal dado, eu afundei, em segundos, porque no meu casco havia um buraco milimétrico por onde o mar entrou aos poucos. Inteiro, eu caí com o primeiro vento porque não havia tijolos, eu era construção mal feita. erguida na pressa, madeira com pregos mal batidos. fachada. eu derreti ao sol porque era de plástico. sumi no sopro porque era pó, eu me quebrei na primeira queda porque, por dentro, não havia mais nada. eu me sentia forte, sem saber que já era oco.
maio 15, 2011
“O domingo tá acabando — já é tarde — amanhã a gente começa de novo. Eu me sinto às vezes tão frágil, queria me debruçar em alguém, em alguma coisa. Alguma segurança. Invento estorinhas para mim mesmo, o tempo todo, me conformo, me dou força. Mas a sensação de estar sozinho não me larga. Algumas paranóias, mas nada de grave. O que incomoda é esta fragilidade, essa aceitação, esse contentar-se com quase nada. Estou todo sensível, as coisas me comovem. Tenho regressões a estados antigos, às vezes, mas reajo, procuro me manter ligado às coisas novas que descobri. Mas tudo fica e se sucede — quase nunca dá tempo de você se orientar, escolher — não gosto de me sentir levado — e aqui não dá tempo. Muitos grilos agindo, muita dúvida, umas voltas de insegurança. Faz tempo ando transferindo uma porção de providências — como é que a gente faz pra se manter sempre alerta? Eu não agüento tanta atividade física e mental.”
maio 14, 2011
A arte de perder não é nenhum mistério
tantas coisas contém em si o acidente
de perdê-las, que perder não é nada sério.
Perca um pouco a cada dia. Aceite austero,
a chave perdida, a hora gasta bestamente.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Depois perca mais rápido, com mais critério:
lugares, nomes, a escala subsequente
da viagem não feita. Nada disso é sério.
Perdi o relógio de mamãe. Ah! E nem quero
lembrar a perda de três casas excelentes.
A arte de perder não é nenhum mistério.
Perdi duas cidades lindas. Um império
que era meu, dois rios, e mais um continente.
Tenho saudade deles. Mas não é nada sério.
Mesmo perder você ( a voz, o ar etéreo, que eu amo)
não muda nada. Pois é evidente
que a arte de perder não chega a ser um mistério
por muito que pareça (escreve) muito sério.
Como posso saber se o que vejo desta janela é de fato a paisagem que vejo?... há muito, finjo acreditar em coisas que o homem teima em trocar pela fragilidade do vidro!... deus existe?... deus não existe?... ambas as coisas são verdade ao mesmo tempo. pergunto-me e pergunto-lhe se a verdade existe mais que um milésimo de segundo. nada é eterno. a eternidade passa depressa como a ciência.
maio 13, 2011
Devagar, o tempo transforma tudo em tempo. o ódio transforma-se em tempo. o amor transforma-se em tempo. a dor transforma-se em tempo. os assuntos que julgamos mais profundos, mais impossíveis, mais permanentes e imutáveis, transformam-se devagar em tempo. mas, por si só, o tempo não é nada, a idade não é nada, a eternidade não existe.
Devagar, o tempo transforma tudo em tempo. o ódio transforma-se em tempo. o amor transforma-se em tempo. a dor transforma-se em tempo. os assuntos que julgamos mais profundos, mais impossíveis, mais permanentes e imutáveis, transformam-se devagar em tempo. mas, por si só, o tempo não é nada, a idade não é nada, a eternidade não existe.
Quando digo que essa coisa que nasce todo dia, cresce até se tornar uma praga, não estou falando só de maus sentimentos, ou de dor, estou dizendo que o amor fere as vezes, que atenção, afeto, carinho e principalmente empatia quando em demasia podem envenenar a sua alma, escrevo pra me curar, meu antídoto sou eu.
"Além desta enfermaria afetiva, tem outras. Posso desabafar?"
Fim de tarde. Dia banal, terça, quarta-feira. Eu estava me sentindo muito triste. Você pode dizer que isso tem sido freqüente demais, ou até um pouco (ou muito) chato. Mas, que se há de fazer, se eu estava mesmo muito triste? Tristeza-garoa, fininha, cortante, persistente, com alguns relâmpagos de catástrofe futura. Projeções: e amanhã, e depois? e trabalho, amor, moradia? o que vai acontecer? Típico pensamento-nada-a-ver: sossega, o que vai acontecer acontecerá. Relaxa, baby, e flui: barquinho na correnteza, Deus dará. Essas coisas meio piegas, meio burras, eu vinha pensando naquele dia. Resolvi andar. Andar e olhar. Sem pensar, só olhar: caras, fachadas, vitrinas, automóveis, nuvens, anjos bandidos, fadas piradas, descargas de monóxido de carbono. Da praça Roosevelt, fui subindo pela Augusta, enquanto lembrava uns versos de Cecília Meireles, dos Cânticos: “Não digas ‘Eu sofro’. Que é que dentro de ti és tu? / Que foi que te ensinaram/ que era sofrer ?” Mas não conseguia parar. Surdo a qualquer zen-budismo, o coração doía sintonizado com o espinho. Melodrama: nem amor, nem trabalho, nem família, quem sabe nem moradia – coração achando feio o não-ter. Abandono de fera ferida, bolero radical. Última das criaturas, surto de lucidez impiedosa da Big Loira de Dorothy Parker. Disfarçado, comecei a chorar. Troquei os óculos de lentes claras pelos negros ray-ban – filme. Resplandecente de infelicidade, eu subia a Rua Augusta no fim de tarde do dia Tão idiota que parecia não acabar nunca. Ah! como eu precisava tanto de alguém que me salvasse do pecado de querer abrir o gás. Foi então que a vi. Estava encostada na porta de um bar. Um bar brega – aqueles da Augusta-cidade, não Augusta-jardins. Uma prostituta, isso era o mais visível nela. Cabelo malpintado, cara muito maquiada, minissaia, decote fundo. Explícita, nada sutil, puro lugar comum patético. Em pé, de costas para o bar, encostada na porta, ela olhava a rua. Na mão direita tinha um cigarro, na esquerda um copo de cerveja.
E chorava, ela chorava. Sem escândalo, sem gemidos nem soluços, a prostituta na frente do bar chorava devagar, de verdade. A tinta da cara escorria com as lágrimas. Meio palhaça, chorava olhando a rua. Vez em quando, dava uma tragada no cigarro, um gole na cerveja. E continuava a chorar – exposta, imoral, escandalosa – sem se importar que a vissem sofrendo. Eu vi. Ela não me viu. Não via ninguém, acho. Tão voltada para a própria dor que estava, também, meio cega. Via pra dentro: charco, arame farpado, grades. Ninguém parou. Eu, também, não. Não era um espetáculo imperdível, não era uma dor reluzente de néon, não estava enquadrada ou decupada. Era uma dor sujinha como lençol usado por um mês, sem lavar, pobrinha como buraco na sola do sapato. Furo na meia, dente cariado. Dor sem glamour, de gente habitando aquela camada casca grossa da vida. Sem o recurso dessas benditas levezas de cada dia – uma dúzia de rosas, uma música de Caetano, uma caixa de figos. Comecei a emergir. Comparada à dor dela, que ridícula a minha, dor de brasileiro-médio-privilegiado. Fui caminhando mais leve. Mas só quando cheguei à Paulista compreendi um pouco mais. Aquela prostituta chorando, além de eu mesmo, era também o Brasil. Brasil 87: explorado, humilhado, pobre, escroto, vulgar, maltratado, abandonado, sem um tostão, cheio de dívidas, solidão, doença e medo. Cerveja e cigarro na porta do boteco vagabundo: carnaval, futebol. E lágrimas. Quem consola aquela prostituta? Quem me consola? Quem consola você, que me lê agora e talvez sinta coisas semelhantes? Quem consola este país tristíssimo? Vim pra casa humilde. Depois, um amigo me chamou para ajudá-lo a cuidar da dor dele. Guardei a minha no bolso. E fui. Não por nobreza: cuidar dele faria com que eu me esquecesse de mim. E fez. Quando gemeu “dói tanto”, contei da moça vadia chorando, bebendo e fumando (como num bolero). E quando ele perguntou “porquê?”, compreendi ainda mais. Falei: “Porque é daí que nascem as canções”. E senti um amor imenso. Por tudo, sem pedir nada de volta.
Não-ter pode ser bonito, descobri. Mas pergunto inseguro, assustado: a que será que se destina?
Assim foram pelos dias, que não eram muitos mais. Quatro, cinco, nem uma semana. Caminhavam descalços na areia, à noite, à beira-mar - juro. Devagar, as mãos se tocavam: a tua é tão longa, a tua tão quadrada. Ele não queria entrar noutra história, porque doía. Ela não queria entrar noutra história, porque doía. Ela tinha assumido seu destino de Mulher Totalmente Liberada Porém Profundamente Incompreendida E Aceitava A Solidão Inevitável. Ele estava absolutamente seguro de sua escolha de Homem Independente Que Não Necessita Mais Dessas Bobagens De Amor. Caminhavam assim, lembrando juntos letras de bossa-nova. Nada sabiam de punks, darks, neons, cults, noirs. Eram tão antigos caminhando de mãos dadas naquela areia luminosa, macia de pisar quando os pés afundam nela lentamente. Carne de lagosta, creme, neve. Tão bom encontrar você, um cantinho, um violão.
No decorrer dos séculos, a História dos povos não passa de uma lição de mútua tolerância, e assim, o sonho último será envolvê-los todos numa ternura comum para os salvar o mais possível da dor comum. No nosso tempo detestar-se e ferir-se porque não se tem o crânio construído exactamente da mesma maneira, começa a tornar-se a mais monstruosa das loucuras.