É difícil sentir saudade no verão, tem sempre muita gente na rua, muita coisa pra fazer, muito o que suar, é difícil ficar indiferente ao calor, ao tempo passando rápido demais, a vida gritando, quando chega o outono as coisas mudam, você acaba percebendo que as pessoas foram embora, que a vida de alguma forma te levou pra longe, que rua não é mais a mesma, que você esta diferente, que os dias são muito parecidos com um passado vazio de pessoas.
Não é ruim, quem sabe eu possa voltar a te amar, talvez eu pare de correr e mande uma carta só porque é outono, quem sabe eu ouça uma musica no ônibus e perceba a besteira que fiz nesses últimos cinco anos, ainda posso contabilizar minhas perdas, tanta gente boa se foi pra sempre, também ficou coisa pra depois, todos esses passos dados na direção oposta, nem sempre nos levaram a diante. As estações mudaram e tudo mudou, de repente já nem sei mais quem eu era antes.
Em ti, por exemplo, o outono é manifesto e
exclusivo. Acho-te bem outonal, meu filho, e teu trabalho é exatamente o
que os autores chamam de outonada: são frutos colhidos numa hora da
vida que já não é clara, mas ainda não se dilui em treva. Repara que o
outono é mais estação da alma que da natureza.- Não me entristeças.-
Não, querido, sou tua árvore-da-guarda e simbolizo teu outono pessoal.
Quero apenas que te outonizes com paciência e doçura. O dardo de luz
fere menos, a chuva dá às frutas seu definitivo sabor. As folhas caem, é
certo, e os cabelos também, mas há alguma coisa de gracioso em tudo
isso: parábolas, ritmos, tons suaves... Outoniza-te com dignidade, meu
velho.»
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